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quarta-feira, 18 de novembro de 2015

desabafo #2

Não gosto de ser patroa e depois de hoje a minha perspectiva sobre o título mudou.
Nunca tive que despedir ninguém, mas hoje isso aconteceu e tenho a dizer que estou plenamente de consciência tranquila com a minha decisão, o que me surpreendeu porque pensei que me iria sentir culpada ou que nem sequer iria conseguir avançar e resolver a situação.
Posso dizer que fui obrigada a tomar esta decisão. Quando fiz a proposta de trabalho aos actores da companhia sempre lhes disse que tinha em mente duas peças de teatro, sendo que todos os actores iriam participar nas duas peças. Todos concordaram e ninguém mostrou desinteresse nisso.
Pelo meio de peripécias e afins ainda só tivemos tempo de ensaiar uma delas.
Hoje passei a maior parte da tarde com a minha irmã e o telemovel ficou esquecido no quarto. Qual não é o meu espanto quando pego no telemovel e vejo duas chamadas não atendidas e uma sms do encenador e uma conversa de grupo com os elementos da companhia?
Depois de ficar a par do que se estava a passar respirei bem fundo e comecei a stressar.
Um dos actores criou uma conversa de grupo onde exigia (e sim, exigia) ficar na companhia mas apenas fazer uma peça. Ora, eu aceitando tal seria obrigada a contratar mais um actor e isso seria mais uma despesa para a qual não tenho possibilidade.
Depois de falar com o encenador acabei por chegar a uma decisão: ou ele fazia as duas peças como ficara combinado ou então eu teria que o mandar embora porque não tinha hipóteses de ter mais um actor a fazer o trabalho que não apetecia fazer ao outro.
Eu confesso que durante toda a conversa que tive com o actor em questão e o resto da companhia eu deveria de parecer uma autentica burra deficiente. O meu problema era que no decorrer desta semana surgiram novos projectos e oportunidades das quais eu ia hoje falar com eles mas se ele saísse eu não queria que ele saísse com o conhecimento desses mesmos projectos, daí as minhas respostas demoradas e o gaguejar constante.
Depois de lhe explicar o meu ponto de vista e de lhe relembrar que eu é que tenho a palavra final e não são os actores que gerem a companhia, ele acabou por enveredar pelo caminho do que nós chamamos aqui no Porto de "bate boca".
Chegou a um ponto em que eu já só lhe repetia as mesmas respostas porque ele só fazia as mesmas perguntas mas de maneira diferente até que um dos outros actores acabou por intervir (okay, eu quase que o obriguei porque para além da minha voz gaga eu só ouvi ele a bufar). Fazendo-o ver que basicamente o que eu lhe estava a dizer era que ou ele fazia as duas peças ou se ia embora, que eu lhe estava a dar duas opções. Mais directo ele não podia ter sido e mesmo assim não resultou, ele continuou com o "bate boca".
Eu só pensava para mim: "respira, não sejas malcriada, os teus pais deram-te educação, nem toda a gente é racional". Incrivelmente isto durou uns bons dois minutos até eu lhe dizer "ou fazes as duas peças ou tens ali a porta, ela está aberta para quem a quiser usar".
Não gosto de conflitos, mas aquele era mesmo um caso perdido e por mais que eu lhe explicasse a situação não havia volta a dar.
Depois disto tudo veio a calma. Claro que ele saiu dramaticamente ... deixou os guiões e bateu a porta, mas depois daquele bang! veio a calma.
Houve situações mal entendidas que tinham sido criadas por ele e que foram faladas e resolvidas, porque ele era esse tipo de pessoa: eu tinha sempre que me justificar com ele. Eu dizia algo, ele distorcia, dizia essas palavras distorcidas aos outros actores e depois eu tinha que ir atrás dizer que afinal as coisas não eram bem como ele estava a dizer.
Sempre tive a política da honestidade na companhia, nada era feito sem o conhecimento de todos e se um dia o actor A faltava e algo era falado referente a essa falta, no ensaio seguinte o actor A tinha conhecimento do que fora dito, bem ou mal. E a minha sorte em todas essas situações era que o encenador estava lá e ouvia tudo, mas se não fosse esse o caso seria sempre a minha palavra contra a dele.
E como disse, depois disto tudo veio a calma. Era como se uma nuvem negra tivesse saído daquela sala. Os actores que antes estavam desmotivados parecia ter ganho novo alento e até nos estiveram a ajudar com os novos projectos e saíram do ensaio (que não foi ensaio) mais entusiasmados com o futuro da companhia.
Nunca pensei que iria despedir alguém, mas também nunca pensei que ao fazê-lo fosse possível sentir-me tão livre de culpa e contente por o ter feito. Prefiro ter dois actores motivados do que três actores que estão ali só por estar.
Gerir uma companhia de teatro não é fácil, mas acho que começo a apanhar o jeito daquilo.

1 comentário:

Balsas disse...

Se fosse chefe adoraria saber como era despedir alguém. Mas deve ser mau xD Mas ao mesmo tempo emocionante. =P